A PROTEÇÃO DO TERCEIRO DE BOA-FÉ NAS ALIENAÇÕES IMOBILIÁRIAS: CONSIDERAÇÕES SOBRE A FRAUDE À EXECUÇÃO E A PUBLICIDADE REGISTRAL
06/04/2025 - Comprador de boa-fé / Fraude a execução / Lei n.º 14.825/2024 / Lei n.º 13.097/2015 / Súmula 375 do STJ / Publicidade registral / Dívida não averbada

É relativamente comum a ocorrência de situações em que um imóvel, embora formalmente disponível para venda, encontra-se sob risco iminente de penhora em razão de dívidas contraídas por seu proprietário. Frequentemente, ao adquirir um imóvel, o comprador descobre, após a concretização do negócio, que o vendedor era réu em ação judicial, sendo o bem objeto de possível constrição patrimonial para satisfação de débitos preexistentes.
Diante desse contexto, não é incomum que o proprietário do imóvel, visando frustrar a execução ou ocultar o seu patrimônio, adote condutas destinadas a alienar o bem a terceiros sem dar publicidade à existência da dívida. Tais condutas usualmente se manifestam nas seguintes formas:
A alienação de imóveis pode ocorrer de forma fraudulenta mediante a omissão de informações relevantes sobre a existência de dívidas judiciais que recaem sobre o bem, seja por meio da divulgação do imóvel por seu valor de mercado, seja mediante sua oferta por preço significativamente inferior. No primeiro cenário, o proprietário promove a venda de modo aparentemente regular, omitindo deliberadamente a existência de litígios em curso, de modo que, após a conclusão do negócio, o adquirente poderá ser surpreendido com o ajuizamento de ação de reconhecimento de fraude à execução, com o objetivo de anular a transação e viabilizar a constrição judicial do imóvel.
No segundo caso, a alienação por valores muito abaixo do praticado no mercado tende a atrair compradores em busca de vantagens financeiras imediatas, mas que, impelidos pela urgência, podem não perceber dois riscos substanciais: a prática de estelionato, em que o alienante sequer possui a titularidade do bem, ou a existência de dívidas judiciais relevantes capazes de comprometer tanto a posse quanto o domínio do imóvel adquirido.
Ademais, há casos em que o proprietário utiliza interpostas pessoas (“laranjas”) para realizar a venda, ou então admite a existência do litígio judicial, prometendo solucioná-lo antes da lavratura da escritura definitiva. Também são relatadas alienações por meio de “contratos de gaveta”, sem o devido registro no cartório de imóveis, o que compromete a publicidade e segurança jurídica do negócio.
Em todos esses cenários, salvo na hipótese em que o proprietário de fato regularize a situação processual, o adquirente poderá enfrentar litígios complexos e, caso reste comprovada sua má-fé, ser responsabilizado judicialmente pela prática de fraude à execução.
Por outro lado, na hipótese em que o comprador adquire o bem sem conhecimento de qualquer litígio judicial, após a verificação da matrícula do imóvel, que se apresenta livre e desembaraçada, age com total boa-fé e formaliza a transação com observância dos requisitos legais, sua posição jurídica deve ser resguardada.
Mesmo diante da posterior notícia de que o imóvel estaria sujeito à penhora em ação de execução movida contra o antigo proprietário, a alienação deverá ser considerada válida e eficaz, desde que não constasse na matrícula do imóvel qualquer averbação de constrição judicial.
É exatamente nesse ponto que incide a proteção conferida pela Lei n.º 14.825/2024, que introduziu o inciso V ao artigo 54 da Lei n.º 13.097/2015, nos seguintes termos:
“Art. 54. Os negócios jurídicos que tenham, por fim, constituir, transferir ou modificar direitos reais sobre imóveis são eficazes em relação a atos jurídicos precedentes, nas hipóteses em que não tenham sido registradas ou averbadas na matrícula do imóvel as seguintes informações:
V – averbação, mediante decisão judicial, de qualquer tipo de constrição judicial incidente sobre o imóvel ou sobre o patrimônio do titular do imóvel, inclusive a proveniente de ação de improbidade administrativa ou a oriunda de hipoteca judiciária.”
Essa inovação legislativa reforça e positivou o entendimento jurisprudencial que já era adotado pelo Superior Tribunal de Justiça desde 2009, quando foi aprovada a Súmula 375:
“O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente.”
Ambos os dispositivos repousam sobre pilares fundamentais do ordenamento jurídico brasileiro, tais como os princípios da segurança jurídica, da função social do registro público, da boa-fé objetiva, da confiança legítima nas relações negociais, bem como da efetividade do direito de propriedade (CF/88, art. 5º, XXII) e da garantia do ato jurídico perfeito (CF/88, art. 5º, XXXVI).
Ainda que a legislação vigente ofereça proteção ao adquirente de boa-fé, a ocorrência de litígios envolvendo fraudes à execução e constrições judiciais pode implicar considerável desgaste emocional, financeiro e processual ao comprador. Dessa forma, é recomendável a adoção de uma conduta cautelosa e diligente na fase pré-contratual da aquisição imobiliária, a fim de mitigar riscos e evitar potenciais imbróglios.
Nesse contexto, destacam-se as seguintes providências essenciais:
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Requerimento de certidão de matrícula atualizada e negativa de ônus reais, expedida pelo cartório de registro de imóveis competente, a fim de verificar eventuais restrições, gravames ou constrições incidentes sobre o bem;
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Solicitação de certidões forenses do vendedor, tanto no âmbito da Justiça Estadual quanto da Justiça Federal, para identificar a existência de ações judiciais que possam comprometer a alienação do imóvel;
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Análise de antecedentes fiscais e trabalhistas do alienante, com a finalidade de identificar débitos tributários ou ações trabalhistas que possam ensejar futura constrição patrimonial;
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Consulta prévia a profissional especializado em Direito Imobiliário, que poderá assessorar juridicamente todas as fases da negociação, bem como identificar eventuais indícios de fraude ou vícios ocultos no negócio jurídico;
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Inserção de cláusulas contratuais específicas, que atribuam responsabilidade objetiva ao vendedor quanto à inexistência de débitos pretéritos e de ações judiciais que possam comprometer a plena fruição e titularidade do imóvel adquirido.
Fonte: Rafael F. Garcia (Bacharel em Direito - OAB/SP 528.198)
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